“O homem é feito não apenas de desesperança, mas também, e fundamentalmente, de fé e esperança; não somente de morte, mas também de ânsias de vida; tampouco unicamente de solidão, mas também de comunhão e amor. A obra de Saint-Exupéry mostra como a literatura pode ser profunda e, não obstante, estar impregnada de cálidos sentimentos positivos. Disse Nietzsche que um pessimista é um idealista ressentido. Se modificarmos levemente o aforismo, dizendo que é um idealista desiludido, daí poderíamos passar a sustentar que é um homem que não termina jamais de se desiludir, pois há na condição psicológica do idealista uma espécie de ingenuidade inesgotável. E assim como a desilusão nasce da ilusão, a desesperança surge da esperança; mas uma e outra, desilusão e desesperança, são curiosamente o signo da profunda e generosa fé no homem.”
O autor do trecho acima é o escritor argentino Ernesto Sabato, que faleceu na madrugada deste sábado, na Argentina. Para quem não sabe, Sabato é – porque um escritor do seu tamanho não morre nunca – um dos mais prestigiados escritores latinos. Entre seus livros mais famosos estão “O túnel” e “Sobre heróis e tumbas”.
A última obra de Sabato publicada no Brasil foi “A resistência” (2008), a qual li e da qual gostei bastante. Nela o autor se dirige a toda a humanidade através de seis cartas que mesclam tons de despedida e desesperança. Paradoxalmente, as cartas são também uma prova “da profunda e generosa fé no homem” que às vezes alguns de nós temos, em arroubos de esperaça. (Atenção: a construção frasal anterior é proposital. Grato.)
Se essas cartas reunidas têm o nome de “A resistência” não é por outro motivo que não a esperança apesar dos pesares. A fé de que o Homem pode ainda fazer com que este mundo seja um bom lugar para viver, e que o sofrimento de milhões (bilhões?) de pessoas tenha solução.
Sabato se vai, mas fica seu exemplo de cidadão contestador e exigente, e de escritor plural e preocupado com os problemas de seu tempo.
P.S.: A citação que abre o post está no livro “O escritor e seus fantasmas”, de Ernesto Sabato.