Consta que R. escrevia um diário. Um quase diário, na verdade. O que acontecia era que R., quando em situações extremas – de amor, ódio, conflitos existenciais ou antes de tomar decisões importantes –, escrevia. Era assim que R. externava seus sentimentos, mesmo que apenas para uma folha de papel. Começou escrevendo letras de músicas. Depois, sob efeito de poetas franceses, R. passou a escrever poemas. Mais adiante, influenciado por escritores ingleses, R. começou a escrever contos. Durante essa fase, R. também leu muitos escritores brasileiros. Foi quando percebeu que poderia, ao mesmo tempo, escrever contos e arquitetar um romance. O romance nada mais seria que os contos organizados, já que os contos de R. tinham um único protagonista: um jovem sem nome, que na maioria das vezes era o próprio R.
O texto abaixo, por exemplo, é um desabafo do protagonista do romance de R. Ou seja: é um desabafo do próprio R.
“Quanto mais penso, mais fico confuso. De que adianta pensar, se soluções não aparecem? Pra quê perguntar, se não vou obter respostas? E as perguntas são tantas… É como falar sozinho, gritar diante de um abismo. Não há respostas, só o eco das palavras. Um ecoar que parece não ter fim.
Mas por que isso? Por que as respostas não aparecem? Por quê? Será que não existem? Mas se existem perguntas, obrigatoriamente deve haver respostas. Ou não? Supondo que não, para que servem as perguntas? Se não há uma coisa, não deveria haver outra, certo? Errado, eu sei. É só desespero.
Existem doenças que não têm cura. Ou será que têm e somente ainda não descobriram? Mas pessoas morrem de doenças sem cura e cientistas morrem procurando a cura para essas doenças. Será que pessoas morrem por não encontrar respostas para as suas perguntas? Será que vou morrer perguntando? E será que, depois de morrer, encontrarei alguma resposta? E se eu não encontrar, o que acontece? Continuarei perguntando, durante a eternidade? Isto é, se a eternidade existir. Se não, só morro, e nada mais. Nada mais?
Se eu morrer e não houver um pós-morte, minhas dúvidas cessam, óbvio. Mas será que elas não ficam de herança? Será que, depois que alguém morre, uma outra pessoa pode assumir seus questionamentos? Isso já não acontece? Sim, acontece. Mas não estou falando de questionamentos morais, filosóficos e sociais. Me refiro a questionamentos do tipo: “não seria melhor fazer as pazes com meu pai?”.
Sinceramente, não sei. Como disse um filósofo, só sei que nada sei. Quero saber, mas não consigo encontrar o caminho correto para descobrir, aprender, solucionar. Se há problema, há solução. Se não há solução, solucionado está. Mas como saberei se o que dizem ser a solução é mesmo a solução? Sempre dizem que há outras saídas, outras alternativas. Mas será que elas existem mesmo quando enxergamos apenas uma única? O que fazer para enxergar e descobrir outras maneiras?
Às vezes aconselham esquecer, parar de perguntar, deixar as coisas acontecerem. Mas não creio que tudo se resolva sozinho, ou “com o tempo”. Em determinados momentos – na maioria deles – se não houver uma ação, não haverá reação. Portanto, não haverá solução. Parado está, parado continuará. Para descobrir respostas, é necessário movimentos. Não movimentos simulados, a simulação não ajuda. Dissimulação também não. É necessário agir, investigar, tentar, percorrer caminhos, arriscar. Mas quem quer correr riscos? O melhor, dizem todos, ou quase todos, é o seguro, o certo, o que conhecemos. O desconhecido é sempre rejeitado, deixado de lado, em segundo plano, como última alternativa. Mas não poderia a última alternativa ser justamente a correta?
Não sei. E quanto mais eu penso, mais fico confuso.”
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