Manual do dândi

Quando, no final de 2009, tirei da estante de uma livraria em Ouro Preto o livro “Manual do dândi – A vida com estilo” (Autêntica, 2009, 34 reais), e passei os olhos por algumas de suas páginas, achei que fosse um livro apenas divertido, bem-humorado. Quis comprá-lo, mas acabei adquirindo outras coisas por lá (dois livros e um Moleskine), e resolvi deixá-lo para depois.

Ano passado, novamente em Ouro Preto para mais uma vez acompanhar o Fórum das Letras – e desta vez muito bem acompanhado por Cassia -, fomos à mesma livraria e lá estava o “Manual do dândi”, talvez até no mesmo mesmo lugar do ano anterior. Mais uma vez, deixei de comprá-lo. Dinheiro não dá em árvore, e entre esse título e um outro (“A reinvenção do escritor”, de Sérgio de Sá), escolhi ficar com este que está entre parênteses.

Meses se passaram e calhou de Cassia resolver esse “problema”: dias atrás, por ocasião de meu aniversário, ela me presenteou com o tão desejado livro.

O “Manual do dândi” reúne três escritos de três autores franceses: Charles Baudelaire, Honoré de Balzac e Barbey d’Aurevilly. Nesses textos, os escritores dissertam sobre o dandismo, mas não ficam restritos a isso, como prova um dos trechos (o de Balzac) reproduzidos abaixo.

Sério e crítico sem deixar o bom humor de lado, o “Manual do dândi” é um livro no mínimo interessante, e mesmo sem tê-lo lido por inteiro recomendo com veemência.

“Denominem-se eles refinados, incríveis, belos, leões ou dândis, não importa: têm todos uma mesma origem; são todos dotados do mesmo caráter de oposição e de revolta; são todos representantes do que há de melhor no orgulho humano, dessa necessidade, bastante rara nos homens de hoje, de combater e de destruir a trivialidade. Vem daí, nos dândis, essa atitude altiva de casta provocadora, até mesmo em sua frieza. O dandismo surge sobretudo nas épocas transitórias em que a democracia não é ainda todo-poderosa, em que a aristocracia está enfraquecida e desvalorizada apenas parcialmente. Na confusão dessas épocas, alguns homens, deslocados de sua classe, descontentes, destituídos de uma ocupação, mas todos ricos de uma força inata, são capazes de conceber o projeto de fundar uma nova espécie de aristocracia, tanto mais difícil de abater quanto estará baseada nas mais preciosas, nas mais indestrutíveis faculdades, e nos dons celestes que nem o trabalho nem o dinheiro podem conferir. O dandismo é o último rasgo de heroísmo nas decadências (…)” (Charles Baudelaire)

“(…) Ao ocupar as mãos, o homem abdica de todo um destino; ele se torna um meio e, apesar de toda a nossa filantropia, apenas os produtos de seu trabalho se tornam merecedores de nossa admiração. Por toda parte, o homem se posta maravilhado diante de alguns montes de pedra e, caso se lembre dos que as empilharam, é para ter pena deles; se ele ainda vê o arquiteto como uma grande mente, seus operários não passam de espécies de correias de transmissão e confundem-se com os carrinhos de mão, as pás e as picaretas.” (Honoré de Balzac)

“Os espíritos que só veem as coisas pelo lado menor imaginaram que o dandismo era sobretudo a arte da aparência, uma feliz e audaciosa ditadura em matéria de toalete e de elegância exterior. Muito certamente é isso também, mas é muito mais. O dandismo é toda uma maneira de ser que não se resume ao aspecto materialmente visível. É uma maneira de ser inteiramente composta de nuances, como sempre acontece nas sociedades muito antigas e muito civilizadas, nas quais a comédia torna-se bastante rara e a convenção triunfa ao preço do tédio.
(…)
O dandidsmo (…) brinca com a regra e, contudo, respeita-a ainda. Sofre com ela e dela se vinga quando tem de compri-la; invoca-a quando dela consegue fugir; domina e é dominado, alternadamente: duplo e móvel caráter! Para jogar esse jogo é preciso ter a seu serviço todas as levezas que fazem a graça, tal como os matizes do prisma, ao se reunirem, formam a opala.” (Barbey d’Aurevilly)

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