Fante e a juventude (ou A Síndrome de Bandini)

Hoje, ao acordar, tive uma quase visão do paraíso. Do meu lado, em cima de uma das pilhas de livros que ficam no tapete ao pé da cama, um pacote da editora Record. Dentro, dois livros: “A balada do café triste“, de Carson McCullers, e “O vinho da juventude“, de John Fante.

Sobre “A balada…” nada direi, por enquanto – até porque nada sei dele, ainda -, a não ser que é traduzido por Caio Fernando Abreu, autor da nota introdutória que acompanha o livro. E que, tal qual “O vinho da juventude”, trata-se de uma reedição.

Gostaria mesmo é de falar um pouco sobre “O vinho da juventude”. Nem sei se realmente posso divulgar isso aqui, mas acho que não fará mal a ninguém: sei da edição deste livro há pelo menos mais de dois anos, e desde então espero ansiosamente por sua publicação. Por que demorou tanto a sair, já que estava tudo pronto (tradução, revisão etc.), eu não sei. Mas, quando finalmente vi o título na pré-venda do site da Livraria Cultura, fiquei radiante. E hoje, quando vi que acordei do lado dele, vocês podem imaginar minha felicidade.

Porque Fante é um autor que, apesar de eu ter lido pouco – apenas “Sonhos de Bunker Hill” e “Pergunte ao pó”, por enquanto – me marcou muito. Fui às lágrimas nos dois livros que li. E, no caso de “Espere a primavera, Bandini”, fiquei tão bobo com o começo do livro que preferi colocá-lo de lado anos atrás, deixando para lê-lo quando estivesse mais maduro. Porque, na época, eu começava a apresentar sinais do que costumo chamar de “Síndrome de Bandini”.

Quem já leu os livros protagonizados por este impagável personagem sabe muito bem do que estou falando. O ar arrogante de Bandini, sua extrema autoconfiança – mas também a sensação de fracasso que às vezes pela qual às vezes é tomado – e sua infantilidade eram características que eu via também em mim. Mas, é óbvio, eu via aquilo de uma maneira boa, não como algo prejudicial. Eu era Arturo Bandini, em carne, ossos e coração.

Foi justamente por isso, por estar me embriagando de alguém que não sou – coisa semelhante aconteceu em relação a “O encontro marcado”, de Fernando Sabino -, que resolvi não prosseguir lendo Fante – ao menos não enquanto não me curasse da “Síndrome”.

O tempo passou e fiquei curado da Síndrome de Bandini. Talvez até demais, visto que uma certa arrogância que eu possuía foi quase totalmente reduzida a pó. O mesmo pó a que Fante nos aconselha questionar. Autoconfiança e infantilidades persistem, mas controladas, reservadas apenas aos momentos – e pessoas – apropriados. Estamos sempre em busca do equilíbrio, não? Mas acho que determinados arroubos ególatras são sempre bem-vindos, principalmente quando não são levados a sério demais. É uma pena que muitas pessoas não entendam isso, porque era algo que eu adorava fazer. (Hum… Não, eu não deixei de fazer.)

Posso então, finalmente, voltar a ler Bandini. Revisitar as obras já lidas e ler as que ainda faltam. Mais que ler Bandini, ler o Fante deste novo “O vinho da juventude”, e também “1933 foi um ano ruim”. Nunca é tarde para correr atrás do tempo perdido. A não ser que você esteja impossibilitado de fazer isso por motivos graves demais.

Nos próximos dias republicarei aqui no blog a resenha que escrevi de “Sonhos de Bunker Hill”. A de “Pergunte ao pó” está aqui.

Fica a dica, também, deste texto de Eric Nepomuceno, publicado no Estadão de hoje, mais sobre Fante que sobre “O vinho da juventude”. Vale muito a pena ler.

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