E então chegamos ao fim

When you’re feeling really great, that’s the time to write a tragedy, and when you’re feeling really down, make a comedy.” (Billy Wilder)

Falar, agora, o que estou sentindo parece-me impossível. Não poderia dizer que há uma enorme dor em meu peito, ou que uma tristeza sem tamanho se abateu sobre mim. Tanto faz se por que seria constrangedor demais ou se por que seriam expressões insuficientes e vazias, ou se, pior, não traduzissem a realidade. Mas agora pareço ter encontrado as palavras certas: confusão e cansaço.

É assim que estou: confuso e cansado. Os últimos dias não foram fáceis, e o que aconteceu ontem foi mais difícil ainda. Depois de quase cinco anos juntos, dividindo alegrias e tristezas – bem mais alegrias, diga-se –, nossa história se encerrou. E, a maior das ironias, finalmente posso utilizar um título que gostei desde o momento em que o vi: “e então chegamos ao fim”.

O intrigante – eu quase escrevo “engraçado”, mas não há nada de engraçado aqui – é que não houve um motivo específico para a nossa separação. Da mesma forma que nos aproximamos – de maneira involuntária, eu diria –, um conquistando o outro aos poucos, fomos nos afastando. Fico me perguntando se não seria melhor haver um outro, ou uma outra, que tivesse nos separado. Ao menos seria uma razão, algo concreto. Eis o motivo da minha confusão. E também do cansaço: na ânsia de tentar compreender o que realmente aconteceu, passei a última noite em claro – outro clichê – lendo e-mails que trocamos, nossas últimas conversas virtuais e tentando lembrar dos últimos contatos por telefone e, claro, dos nossos últimos encontros.

Tentei, também, lembrar de algo que eu teria feito que pudesse originar essa indiferença que passou a nos dominar. Não sei se feliz ou infelizmente, minha memória – que ultimamente anda fraca/falha, é verdade – nada revelou. Já a dela, eu não sei. E, apesar de, agora, querer saber, daqui a alguns dias nada mais me importará. Além do que, não haverá mais conversas, não se termina algo para se continuar uma outra coisa. Isso não entra em minha cabeça. Se não demos certo juntos, por que haveríamos de dar certo separados?

Não posso negar que ela ainda ocupa boa parte de meus pensamentos. Mas agora não em devaneios sobre o futuro ou ternas lembranças. Apenas me questiono se ela estaria em casa, sentindo-se também atordoada pelo fato de não mais sermos, ou se está por aí, em alguma festa, ou se saiu com alguma amiga, ou se simplesmente deitou-se e foi dormir o sono dos (in)justos.

Mas também não posso negar que a ideia de que, depois de tantos anos, finalmente poderei voltar a não apenas olhar e desejar outras mulheres, mas também abordá-las, e quem sabe levá-las para a cama, me seduz. Durante o tempo que passamos juntos, nunca deixei de admirar e olhar para outras, mas o respeito que tinha por ela – e continuo tendo, claro, apesar de agora querê-la bem longe de mim – e minha obstinação em ser fiel – o que me deixa com a consciência tranquila, afinal, ninguém poderá me recriminar, dizer que eu a traí e que por isso ela me abandonou etc. – me impedia de um olhar mais demorado, ou até mesmo de um flerte brincalhão, sem intenção alguma de ser nada mais que um flerte.

Agora que chegamos ao fim, estou livre para fazer o que eu bem entender. Inclusive ficar sozinho com essa enorme dor em meu peito e essa tristeza sem tamanho que se abateu sobre mim.

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