A resposta, talvez

Aos 22 anos eu era um rapaz muito inseguro com relação aos rumos a tomar, mas tinha uma namorada, e tinha preocupações literárias. Esses dois quadros parece que, de certa maneira, me ajudaram a enfrentar o problema da perplexidade que costuma ocorrer aos jovens, ou que pelo menos ocorria com certo rigor na minha geração. Bem, não era uma pessoa estudiosa, não levava a vida muito a sério, mas os mecanismos de preparação para a vida funcionavam inconscientemente em mim. Eu já publicava crônicas e pequenos poemas de verso livre nas revistas do Rio de Janeiro, e tinha sobretudo a fortuna de contar com um grupo de amigos todos eles mais estudiosos do que eu, levando a vida mais a sério do que eu porque trabalhavam, tinham os seus empregos fixos, e eram acadêmicos de direito, de medicina etc., e essas pessoas, como eu já tenho assinalado em outras entrevistas, foram muito camaradas para comigo, porque me recebiam de igual para igual, me tratavam como se eu fosse uma pessoa que realmente tivesse algum merecimento, então me estimulavam muito e de certa maneira ajudavam a enfrentar as barras da inquietação, da angústia que eram minhas companheiras bastante inseparáveis. Aos 82 anos, evidentemente, esse quadro é completamente outro. São sessenta anos de vida, e seria muito difícil que alguém não tivesse aprendido nada durante esse tempo, não tivesse recolhido nenhuma parcela de filosofia da vida, de comportamento, de compreensão das coisas. Então, eu acho que agora eu estou, evidentemente, muito mais equipado para viver, embora a margem de vida que sobra não seja a maior. Mas, de qualquer maneira, o caminho percorrido assinala isso, que eu fui de evolução em evolução, de passo em passo e passo a passo, ou talvez um pouco aos tropeções, mas fui vivendo ao longo da vida e aprendendo coisas. Eu acho que a diferença fundamental não existe entre o jovem inquieto e um velhinho já mais ou menos tranqüilo, o temperamento não mudou, apenas as experiências me ajudaram a ver mais claro as coisas que eu via então de uma maneira um pouco embaçada.”

De uma entrevista de Carlos Drummond de Andrade.

This entry was posted in Citações. Bookmark the permalink. Post a comment or leave a trackback: Trackback URL.

Post a Comment

Your email is never published nor shared. Required fields are marked *

You may use these HTML tags and attributes <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <s> <strike> <strong>

*
*