Um dos melhores discos da carreira do Barão Vermelho, “Álbum”, lançado em 1996, ironicamente só tem uma canção composta por membros da banda (“Só as mães são felizes”, de Frejat e Cazuza). Outra curiosidade é o fato de “Álbum” ter sido gravado meio que por acaso.
A história é contada no livro “Barão Vermelho – Por que a gente é assim” (Globo, 2007, R$ 49,90), escrito pelo jornalista Rodrigo Pinto em parceria com Guto Goffi (baterista da banda) e Ezequiel Neves (o homem que “descobriu” o BV). Parafraseando e resumindo o que está dito na obra, eis os fatos:
O Barão Vermelho entrou no ano de 1996 em baixa. O então último disco do grupo, “Carne Crua”, teve repercussão muito abaixo do esperado. A banda colocava o fraco desempenho de “Carne Crua” na conta da Warner, que não teria feito uma boa divulgação do trabalho. As relações entre gravadora e Barão Vermelho não estavam boas, mas, por contrato, eles deviam ainda um disco à empresa.
Sem querer investir em músicas inéditas, que, por mais que fossem boas, poderiam afundar de vez a banda, já que o público não havia ficado contente com “Carne Crua”, o Barão teve a ideia de fazer um disco de covers. Eis aí, de forma resumida, a origem de “Álbum”.
Composto por 10 canções, esse disco é de longe um dos melhores trabalhos da banda. Porque um grupo musical não é avaliado apenas pelas letras de suas músicas, mas também pelo que faz no instrumental de suas canções. Exemplo claro disso seria se o Radiohead gravasse uma música do Restart. (O horror, o horror!)
Tudo o que há de melhor no Barão Vermelho está neste disco, e nele também estão alguns dos maiores sucessos da banda. Ele começa com “Só pra variar”, de Raul Seixas, Kika Seixas e Claudio Roberto (“Mas diz que o paraíso já tá cheio, neném/ Eu vou levar um lero com o diabo/ Antes que o inferno fique cheio também”). O dedilhar inicial de guitarra e violão pode lembrar vagamente alguma coisa do Alice In Chains, mas a percussão de Peninha logo desfaz essa impressão. Aliás, é interessante notar o cuidado com que foi feito o arranjo desta música, uma das coisas mais bem produzidas já feitas pela banda.
Em seguida vem a divertida “Malandragem dá um tempo”, de (é o que está no encarte) Popular P, Adelzonilton e Moacyr Bombeiro, que o Barão utilizou propositalmente para “tocar na polêmica da maconha”, como disse o Frejat na época (“Vou apertar/ Mas não vou acender agora/ Se segura, malandro/ Pra fazer a cabeça tem hora”).
Depois vem outra música cujo arranjo é sublime: “Vem quente que eu estou fervendo”, de Carlos Imperial e Eduardo Araújo (“Se você quer brigar/ E acha que com isso estou sofrendo/ Se enganou, meu bem/ Pode vir quente que eu estou fervendo”). Em termos de arranjo, é uma das três melhores do disco. Esta versão do Barão para “Vem quente que eu estou fervendo” é simplesmente maravilhosa, diria até insuperável. Um rock vigoroso como poucos, o tipo de música que você pode ligar o “repeat” e ouvir ad infinitum. Difícil destacar algo em um arranjo como esse, mas as guitarras, a percussão e os metais são simplesmente indescritíveis.
Única canção “barãovermelhiana” do disco, “Só as mães são felizes”, composta por Frejat e Cazuza, é a segunda música mais longa do CD, com pouco mais de 5 minutos de duração (“Já reparou na inocência cruel das criancinhas/ Com seus comentários desconcertantes/ Elas advinham tudo/ E sabem que a vida é bela”). Ela é também a única que destoa climaticamente do disco. Blueseira, arrastada, com o instrumental em primeiro plano e o vocal de Frejat em segundo, “Só as mães são felizes” era uma música que me dava um certo medo de ouvir quando ganhei “Álbum” de minha madrinha, em julho de 1997 (na época eu tinha 14 anos). Hoje, é uma das minhas prediletas.
(Antes de continuar, e aproveitando para interromper o texto, cuja segunda parte será publicada entre quarta e quinta-feira, um comentário ainda mais pessoal: por conta de o disco que ganhei de presente estar já um tanto gasto – capa arranhada, aquelas garrinhas que seguram o CD quebradas e encarte com os cantos rasgados – resolvi comprar, no ano passado, um novo “exemplar” do disco, para conservar aquele que me foi dado.)
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