A história de um casamento, de Andrew Sean Greer

Por que escritores como John Fante, F. Scott Fitzgerald, Charles Bukowski e tantos outros escreveram romances cujos protagonistas são aspirantes a escritor (como eles um dia foram)? A resposta não é a tão simples “porque foi mais fácil”. Escrever uma história girando em torno de um alter-ego é a maneira que um autor tem de falar sobre tudo o que o cerca, sobre suas vivências mais pessoais e marcantes. Não se trata apenas de uma saída fácil para se escrever algo. Muitas vezes essa é a melhor saída, ou mesmo a única.

Até porque escrever não é fácil, nem mesmo quando o protagonista da história é uma versão do próprio autor. Afinal, a menos que ele tenha como propósito ferir com palavras muitos ao seu redor, ele precisará fazer uma série de modificações na realidade que deseja ficcionar. Um desafeto, por exemplo, terá que ter no mínimo o nome trocado (mas o mais indicado seria misturar as características de vários desafetos em um só). O mesmo vale para as paixões platônicas, ainda que esquecidas: não podem, jamais, ser identificadas, ainda mais se o autor for comprometido…

Pois se colocar no papel uma espécie de cópia de si mesmo já é um tanto complicado, imaginemos então um autor escrever um romance cujo personagem principal é uma mulher. E mais: utilizar essa personagem como narradora do livro. Difícil, não?

Para Andrew Sean Greer, autor de “A história de um casamento” (Nova Fronteira, 288 págs.), não. Ao menos aparentemente. A sensação que fica ao ler o romance, que tem Pearlie Cook como narradora, é a de que sua concepção não foi “dolorosa” para o autor, e sim o contrário: prazerosa e natural.

Como está óbvio no título, Pearlie Cook conta a história de uma relação amorosa. Mas não uma relação comum. A de Pearlie com Holland Cook começou durante a Segunda Guerra Mundial e culminou num triângulo amoroso, além de ter sofrido a influência de uma série de fatores que, se comentados aqui, farão o livro perder toda a sua graça.

Esses fatores, aliás, são os responsáveis pelas seguidas surpresas que tem o romance. Até a metade do livro o leitor é diversas vezes atordoado por fatos que o autor faz questão de deixar escondidos, só os revelando quando bem entende, meio que de supetão. Essas revelações fazem com que o leitor tenha vontade de seguir lendo o romance mesmo que já seja, sei lá, 1 hora da manhã e ele precise acordar cedo no dia seguinte.

Aspectos históricos e sociais dos Estados Unidos são o grande trunfo de “A história de um casamento”, mas os desdobramentos amorosos da obra também chamam – e muito – a atenção. Outro atrativo são os personagens secundários: as tias “beatas” de Holland; o filho do casal, Sonny; o divertido cachorrinho da família, Lyle; e, claro, o misterioso terceiro elemento do triângulo amoroso, Buzz.

Comparado a “O bom soldado”, clássico de Ford Madox Ford, “A história de um casamento” talvez pudesse ser um pouco mais curto, mas nem mesmo isso atrapalha o andamento e a qualidade do livro, que é belíssimo.

* Até o momento de publicação deste post, “A história de um casamento” pode ser encontrado por meros 10 reais em uma grande loja virtual. Post escrito ouvindo “Black gives way to blue“, do Alice in Chains.

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