Onda de crimes

Pelo título, este post poderia ser sobre a sem-vergonhice que é a segurança pública neste país, onde, aos poucos, nós vamos perdendo um dos principais direitos assegurados pela nossa constituição (que, aliás, ultimamente tem sido jogado no lixo pelos políticos que deveriam cumpri-la e fazer com que ela fosse sempre cumprida): o direito de ir e vir.

Mas não quero falar sobre isso, quero falar sobre um livro que “descobri” hoje na minha estante. E aproveito para falar da minha estante.

Eu sempre me preocupei em comprar e ganhar livros, mas nunca me preocupei em como e onde guardá-los. A isto se chama colocar o carro na frente dos bois, e não aconselho ninguém a fazer o mesmo. Em 2007 cheguei num ponto crítico: eu estava me sentindo sufocado pelos meus livros. Tropeçava neles quando acordava (porque deixo muitos em cima do tapete ao lado da cama), batia os cotovelos neles enquanto digitava no computador (porque deixo muitos ao alcance das mãos para os momentos de revisão e criação de textos) e começava a ter problemas com poeira e bichos dentro de algumas caixas onde guardava muitos deles. Foi quando, aproveitando uma promoção no hipermercado, comprei uma estante de plástico só para deixar a coisa um pouco menos desorganizada.

Essa estante só deu para aliviar um pouco a situação, porque os livros continuaram sendo comprados e sendo ganhos – sem contar aqueles para “trabalho”, ou seja, os que recebo para resenhar. Em pouco tempo eu estava novamente com o mesmo problema: excesso de livros e falta de lugar para guarda-los.

E então, no início deste ano, meu pai teve uma ideia excelente: fazer umas prateleiras para os livros usando um material que tínhamos em casa e estava sem destino. Precisamos comprar apenas os suportes para as prateleiras, que são de vidro. Depois de tudo pronto, comecei a arrumar as prateleiras. Mas, para o meu espanto, a estante de plástico continuou com muita coisa em cima, e os livros continuaram (e continuam, graças a Deus!) chegando.

Como é uma quantidade considerável, às vezes esqueço que possuo um ou outro livro, e só os reencontro quando preciso de alguma obra escondida nas entranhas da estante de plástico. E foi justamente o que aconteceu hoje. Meu intuito era pegar um romance chamado “Queria que você estivesse aqui“, de Stewart O’Nan, para deixá-lo mais perto de mim (porque faz tempo que deveria tê-lo lido e agora, com ele à vista, espero não demorar mais para fazer isso), “descobri” que tenho um livro chamado “Onda de crimes“, de James Ellroy, autor de “Dália Negra” e “Los Angeles – Cidade Proibida”, entre outros.

Este “Onda de crimes” se constitui de contos, reportagens e artigos de Ellroy publicados numa revista americana chamada “GQ”. Eu o comprei em 2007 na Bienal daqui, em Salvador, e desde o dia da compra (17 de abril), eu não mais o vi. Fui vê-lo novamente hoje, quase dois anos depois. Resolvi tirar a poeira que o cobria e ler um dos textos, “O assassino de minha mãe”, que são reminiscência do autor sobre o assassinato de sua mãe, um crime até hoje não resolvido. O texto é direto, sem rodeios, curto e grosso, e é sensacional. Ellroy não hesita em dizer que chamava, quando garoto, sua mãe de bêbada e puta, e que, na época do assassinato, ele a odiava. Entre outras coisas, diz que “Dália Negra”, livro escrito baseado em fatos reais, em mais um caso de uma mulher assassinada, foi uma tentativa de se livrar do peso da morte de sua mãe. O livro, dizem, é muito bom, mas Ellroy não ficou tranquilo depois de escrevê-lo. Tanto que volta ao assunto neste texto, e vai mais uma vez tentar encontrar respostas para o crime.

James Ellroy teve uma vida conturbada: chegou a viciar-se em drogas e cometer furtos. Mas, felizmente, a literatura mudou seu rumo para melhor. “O assassino de minha mãe” é uma pequena amostra (15 páginas, somente) de sua obra, mas já valeu a grana gasta com o livro. Além disso, me deixou curioso a respeito do restante da obra e também das outras obras de Ellroy. Para a estante de plástico ele não volta. Foi promovido para a prateleira de vidro ou, talvez, até para o tapete ao lado da cama.

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