O Fórum das Letras de Ouro Preto é um dos eventos literários brasileiros surgidos nos últimos anos que mais têm atraído atenção e espectadores. Em sua sexta edição neste ano de 2010 o Flop, como é também conhecido, faz uma homenagem ao continente africano, tendo entre seus convidados vários autores de lá (Mia Couto, Ondjaki e Luandino Vieira são alguns exemplos).
O evento teve início no dia 10 de novembro, anteontem, mas somente a partir de hoje é que passarei a comentar aqui no blog algumas das mesas que acontecerão até o dia 15.
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No final da manhã de hoje, sexta-feira, aconteceu a mesa “Literatura em quadrinhos”. Os convidados foram Rafael Coutinho e Daniel Galera – o primeiro, quadrinista; o segundo, escritor – autores de “Cachalote”, graphic novel publicada recentemente pela Companhia das Letras. A mesa faz parte do Ciclo Bravo! de Jornalismo e Literatura, uma parceria da revista Bravo! com o Fórum das Letras.
Mediados pelo roteirista e pesquisador de quadrinhos Wellington Srbek, os autores discutiram as diferenças entre histórias em quadrinhos e literatura, falaram sobre o mercado editoria e o processo de criação de “Cachalote”, e até mesmo sobre questões de copyright e pirataria.
Tanto Coutinho quanto Galera tiveram posições semelhantes e inesperadas – ao menos para mim – no que se refere à relação entre literatura e HQs. Rafael Coutinho, que é filho do cartunista Laerte, disse que, apesar de ambos os gêneros terem pontos em comum, suas Histórias são independentes. Daniel Galera afirmou – não exatamente com as palavras a seguir, que HQs são, de certa forma, literatura, mas não são literatura. As linguagens e o processo de desenvolvimento de uma HQ é completamente diferente do da escritura de um romance, por exemplo.
Segundo Galera, os quadrinhos são tão sérios quanto a prosa de ficção, mas ele percebe que ainda há um preconceito contra o gênero HQ. Coutinho concordou e afirmou que os quadrinhos são tidos como “coisas para criança”, mas que, na verdade, pessoas de todas as idades leem HQs. Prova disso é o aumento do número de graphic novels publicadas nos últimos anos no Brasil.
Apesar de alguns temas discutidos serem polêmicos – mercado editorial e divugação via internet dariam uma mesa extra (falarei um pouco sobre este último tópico nos próximos dias) – o encontro foi bem-humorado, revelador – Daniel Galera afirmou, por exemplo, que tanto ele interferiu nos desenhos de Rafael Coutinho quanto este último interferiu no roteiro – e com muitos bons momentos. O ponto “estranho” – porque dizer “negativo” seria exagero, talvez – ficou por conta do mediador, que participou mais do que deveria, na minha opinião.
Vejo a mediação das mesas como um dos fatores mais importantes de um evento literário. Um mediador pode fazer com que um encontro aparentemente chato se torne uma conversa excelente, mas também pode fazer o contrário, e fazer com que convidados excelentes fiquem perdido em cima do palco. Não foi este o caso, mas Srbek poderia ter se colocado mais como mediador e menos como convidado da mesa.
O mediador, para mim, é o provocador, mas precisa ser discreto. Na Flip de 2007 a jornalista Dorrit Hazarim deu uma aula de como se deve mediar uma mesa. Ela ficou responsável por conduzir nada mais nada menos que a conversa entre Robert Fisk, talvez o maior jornalista de guerra que já pisou – e ainda pisa – neste planeta, e Lawrence Wright, autor de “O vulto das torres”, um livro fundamental para entender melhor os ataques de 11 de Setembro. A presença de Dorrit Hazarim quase não se fez por notar, e a mesa foi uma – ou talvez a mais – brilhante daquela Flip.
Daqui a pouco vou conferir a mesa com os escritores Rodrigo Lacerda e Ondjaki, cujo tema é “Memória reinventada” e tem apoio da Portugal Telecom. O último romance de Lacerda, “Outra vida”, ficou com o segundo lugar do Prêmio Portugal Telecom de Literatura. Reinaldo Moraes, autor que completaria a mesa, avisou ontem que não poderia vir ao evento.