“No fato de um homem bem-educado fazer bem aos nossos sentidos: no fato de ele ser talhado em uma madeira que é dura, suave e cheirosa ao mesmo tempo. A ele só faz gosto o que lhe é salutar; seu prazer, seu desejo acabam lá onde as fronteiras do salutar passam a estar em perigo. Ele advinha meios curativos contra lesões, ele aproveita acasos desagradáveis em seu próprio favor; o que não acaba com ele, fortalece-o. Ele acumula por instinto tudo aquilo que vê, ouve e experimenta à sua soma: ele é um princípio selecionador, ele reprova muito. Ele está sempre em sua própria companhia, mesmo que esteja em contato com livros, pessoas ou paisagens: ele honra pelo ato de selecionar, pelo ato de permitir, pelo ato de confiar. A todo tipo de estímulo ele reage lentamente, com aquela lentidão que uma longa cautela e um orgulho desejado inculcaram nele – ele testa o estímulo que se aproxima; ele está longe de ir ao encontro dele. Ele não acredita nem no “infortúnio” nem na “culpa”: ele dá conta de si mesmo e dos outros; ele sabe esquecer… Ele é forte o suficiente a ponto de fazer com que tudo tenha de vir para o seu bem… Vá lá, eu sou antípoda de um décadent: pois acabei de descrever a mim mesmo.”
Friedrich Nietzsche em “Ecce Homo“.
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