Um dos acontecimentos mais excitantes na vida de um leitor é a “descoberta” de um bom livro. “Descoberta” entre aspas porque não se trata, claro, de ser o primeiro a ter em mãos a obra, mas sim porque não se sabia, até então, de sua existência. Ou seja, você não leu nada sobre o livro, tampouco recebeu uma indicação de alguém. Simplesmente aconteceu de você “esbarrar” no livro, folheá-lo e ele cair no seu gosto.
Foi mais ou menos o que se sucedeu entre “Desperta e lê” (Martins Fontes, R$ 58,40), do filósofo espanhol Fernando Savater, e eu. Conhecia o nome do autor “de vista”, por causa de um livro seu chamado “Ética para meu filho”, e só. Nunca me recomendaram ler nada dele, tampouco tive curiosidade para saber quem ele é. Na verdade, sempre tive a impressão de que “Ética para meu filho” é uma obra oportunista, assim como seu autor, e isso bastou para que não houvesse nenhum interesse de minha parte.
Isso mudou quando me deparei com “Desperta e lê”, reunião de “artigos destinados a jornais e revistas”, “umas quantas conferências, alguns prólogos” e outros textos do autor sobre cinema, literatura, filosofia, cultura, política e sociedade. O texto que me fez começar a ler o livro chama-se “A derrota de Julien Benda”, sobre esse atualmente pouco conhecido e divulgado escritor e filósofo francês. Benda é autor de uma obra no mínimo essencial, “A traição dos intelectuais”, e sobre ele disse Sartre, por ocasião de sua morte, em 1956: “Vai nos fazer falta sua vigilância”.
Li, também, com certa euforia, entusiasmado com a qualidade do que passava por meus olhos, um texto sobre Groucho Marx, outro sobre Michael Crichton, um terceiro sobre Jorge Santayana e, finalmente, um sobre o livro “Esquerda e direita” (no Brasil com a ordem invertida do título, o que pode significar alguma coisa: “Direita e esquerda”), de Norberto Bobbio. Foi, aliás, mais precisamente esse texto que me fez decidir adquirir o livro. E é com um trecho dele que encerro este post que nada mais é do que uma recomendação: dê uma chance a “Desperta e lê”, de Fernando Savater.
“Como tantos de nós, que nos criamos e passamos grande parte da juventude sob o franquismo, sempre me considerei de esquerda. É preciso ser imbecil, abjeto e masoquista para viver sob uma ditadura direitista e reagir de outro modo. Mas nem por isso jamais senti a menor simpatia pelas ditaduras de esquerda, fosse a da União Soviética, a da China ou de Cuba. (…) Creio que uma pessoa de esquerda tem de se alegrar tanto com o final do franquismo quanto com o final do stalinismo ou do castrismo. Mas, então, o que significa hoje ser politicamente de esquerda?
Para Norberto Bobbio, a esquerda se distingue por sua insistência na igualdade; sua política pretende corrigir, mediante a redistribuição econômica e a educação, os escandalosos privilégios e vantagens que uma minoria dos seres humanos tem sobre a grande maioria (…)”